Grândola, vila morena | Arturo Reguera

Grândola, vila morena cantada pela primeira vez em público.

No seu livro Sonata de Amigos conta Benedicto que, desde que ouviu pela primeira vez um disco do Zeca em Madrid na casa duns amigos, não parou até que conseguiu pôr-se em contacto com aquele cantor que o impressionara tanto. Contactado o Zeca em Setúbal, o Benedicto propôs-lhe ir cantar à Galiza, e assim, em Maio de 1972, José Afonso realizou a sua primeira digressão galega com três concertos, em Ourense, Lugo e Santiago de Compostela, nos dias 8, 9 e 10 de Maio de 1972, que tive o prazer e o privilégio de acompanhar. Dos dois primeiros não há muito a referir, umas dezenas de pessoas que comentaram com entusiasmo as canções daquele cantante português, até então desconhecido. Mas em Santiago as dezenas transformaram-se em várias centenas, o que se explica porque naquela altura, na Universidade de Santiago, era claro que uma actividade cultural organizada por elementos ligados à luta antifranquista tinha sucesso de público garantido, ainda que a priori não se soubesse mais nada.
O desconhecimento era o mesmo por parte do Zeca, que começava a tomar contacto com uma Galiza até então ignorada. Como anedota significativa posso contar que, sendo uma das primeiras canções o Natal dos Simples, explicou como introdução que, nas aldeias portuguesas, os miúdos iam cantando pelas casas, e as pessoas davam-lhes pão, queijo, castanhas… fez uma pequena pausa e, julgando que “castanha” seria sem dúvida palavra exótica na Galiza, corrigiu: “marron”…
O facto é que se produziu um fenómeno que não sei se terá ocorrido alguma vez em qualquer outro lugar: um cantor desconhecido, de que quase nenhum dos presentes tinha ouvido falar, nem tinha ouvido uma única música, provoca um enorme entusiasmo naquela gente, que seguia as letras com o programa que se imprimira, com uma atenção que impressionou o Zeca, como contava de volta a Portugal, que também acompanhei, aos seus amigos.
Decide então cantar Grândola Vila Morena, que já tinha gravado no disco Cantigas do Maio, mas que não tinha cantado ainda em público. Só na Páscoa de 1973 percebi o porquê daquela escolha. Naquela altura viera passar férias com o Zeca e a Zélia, e por acaso parámos a almoçar em Grândola, a caminho de Melides, onde iam à procura duma casa para as férias do verão. Enquanto o resto dos amigos ficava no restaurante bebendo café e conversando, o Zeca convidou-me a acompanhá-lo e levou-me a ver o prédio da SMFOG, a querida Música Velha, na altura encerrada pela PIDE; e ao ouvi-lo falar da noite que gerou a canção, percebi que o Zeca, para cantá-la, precisava de sentir um ambiente de solidariedade como aquele de Grândola, que precisamente encontrara naquele 10 de Maio em Santiago de Compostela. Para evocar o Alentejo, mandou-nos ficar em pé, darmos os braços e seguir o ritmo movendo-nos para os lados, à alentejana, e depois dum pequeno treino, quando julgou que estávamos preparados, cantou, e todos nós, em coro, o acompanhámos.
Anos depois contaria à imprensa: «A primeira vez que cantei Grândola foi na Galiza: a malta entusiasmou-se. Criou-se um efeito de fraternidade muito intenso, punham-se de pé, cantavam, agitavam os braços. Foi a experiência mais maravilhosa. Algo especial. […] Talvez ninguém me entendesse como na Galiza».

 

 

VILLAR, Benedicto García (2008). Sonata de amigos. Vigo: Edicións Xerais de Galicia, S.A., p.87.

Cantou o Zeca e, ao final do recital, cando crin que xa estaba todo acabado, agarroume ao xeito alentejano e empezou a marcar o son cos pés, tamén ao modo alentejano. Comezou a cantar o Grândola. A xente púxose en pé, tiña a letra da canción, a melodía era fácil e a emoción moita. O resultado foi que se cantou unha segunda vez. O Burgo das Nacións foi testemuño da estrea en directo desa inesquecible canción. José Afonso xa gravara o Grândola pero foi en Santiago onde o interpretou por primeira vez en directo, tal e como el mesmo declarou nunha entrevista que concedeu á revista Tiempo en 1982 E no Burgo descubriu o valor do Grândola. Alí percibiu unha corrente de simpatía, un recoñecemento recíproco que perviviu no tempo. Cando, anos despois, puxemos en marcha a homenaxe a José Afonso, Arturo Reguera e mais eu entrevistámonos con Xerardo Fernández Albor, daquela Presidente da Xunta, para pedir axuda para o proxecto. A resposta foi inmediata e contundente: Para o Zeca o que fose necesario. Velaí unha mostra do sentimento que provocaba o Zeca en Galicia.

Jose AbreuGrândola, vila morena | Arturo Reguera